Quem sou eu: uma pergunta simples, uma resposta que levou anos. E ainda está sendo respondida.
- Paulo Francisco da Silva Carneiro
- 20 de jul.
- 4 min de leitura
Atualizado: 21 de jul.
Em 19 de julho de 2025, me vi diante de um exercício inesperado.
Era mais uma aula do curso de comunicação e oratória que comecei recentemente. O tema? Falar sobre mim.

Parecia simples. Mas não foi.
Nos dias que se seguiram, essa pergunta aparentemente básica — "quem é você?" — ficou reverberando na minha cabeça. E eu percebi que minha resposta não cabia em um currículo. Não cabia em um cargo. Nem num endereço. Ela precisava de mais espaço.
Então eu escrevi este texto.
Eu me chamo Paulo. E como muitos, levei anos para entender que a pergunta "quem é você?" não se responde com o que a gente faz — mas com o que a gente viveu.
A resposta está nas camadas. Nas quedas e escolhas. Nas pessoas que me marcaram — e nas que me feriram. Nos ambientes que quase me mataram — e nos que me fizeram florescer.
Minha história começa numa casa dividida, literalmente e metaforicamente.
Sou filho de pais separados desde que me entendo por gente, cresci com uma verdade dolorosa: meu pai traiu minha mãe. Foi pego com a doméstica na cozinha de casa. Mesmo assim, por muito tempo, ele era meu herói. Me levava pra fazenda onde era gerente. Produziam mais de 1,5 milhão de litros de cachaça por ano. Ele era respeitado, forte, admirado. Mas havia manipulação disfarçada de carinho — ele queria que eu admirasse mais a ele do que à minha mãe. E por um tempo… conseguiu.
Aos sete anos, tudo virou do avesso.
Meu avô — uma referência pra mim — morreu de infarto. Segundo minha mãe, entrei em depressão. Ao mesmo tempo, meu pai perdeu o emprego. E nunca mais voltou a ser o mesmo. Parou de pagar pensão, deixou de estar presente, foi sumindo. Tentou a sorte em vários cantos do mundo. Sempre atrás de um novo “grande plano”. Mas cada plano deixava um rastro: menos vínculo, menos afeto, menos presença. Hoje, só quero saber se ele está vivo. Nada além.
Minha mãe, ao contrário, sempre esteve presente. Engenheira. Forte. Incansável. Foi ela quem nos sustentou, me criou, acreditou em mim — mesmo quando eu mesmo não acreditava.
Ano passado, ela foi diagnosticada com hidrocefalia de pressão alta. Quase perdeu os movimentos. A mulher mais forte que eu conheci… ficou frágil. E naquele momento, entendi meu papel com clareza: eu precisava cuidar dela. Não por mim. Mas para que ela vivesse mais tempo com a netinha, minha afilhada. Hoje, cada dia ao lado dela… é ouro.
Minha irmã sempre foi uma fortaleza. Inteligente, determinada. Ela viveu o trauma da escassez de forma mais consciente do que eu. E venceu na vida. E isso incomodou meu pai — a ponto de, há dois anos, levantar a mão pra ela. Desde então, pedi para que nunca mais voltasse em BH. Assim tem sido. Ainda estou aprendendo a perdoar ele.
Durante quase todo o período de escola, fui chamado de preguiçoso, de incapaz. O ambiente escolar me violentava emocionalmente. Lembro de experiencias como: Ser piada de uma professora aos seis anos, por não conseguir acompanhar colegas de sala. E também de na segunda série do fundamental perder a van escolar, pois a professora não me deixou sair da sala, antes de terminar de escrever a matéria no caderno. Até que um professor acreditou em mim. Me nomeou monitor de matemática. Foi ali que algo virou a chave: eu era capaz. O nome dessa fase da minha vida é: Confiança Aqui percebi que o problema nunca foi estudar — era o ambiente.
Comecei a buscar redenção nos estudos. Tentei curso técnico em eletrônica. Depois, design gráfico. Nenhum deles me despertou. Mas um nome ficou comigo desde uma feira de profissões da UFMG em 2005: Engenharia de Produção. Tentei. Passei. Fiz um semestre em Sistemas de Informação numa federal, só pra provar que eu podia. Mas o sonho era outro. Decidi voltar a BH. Me matriculei na PUC. Lá, tudo fluiu. Após um ano, consegui um estágio. Pela primeira vez, me senti bom em algo. Era bom em trabalhar. E queria ser ainda melhor.
Lembro de fazer uma entrevista que exigia inglês. Fui muito mal. Saí de lá decidido: eu ia fazer intercâmbio. Juntei dinheiro. Planejei com minha mãe. E em 2013, embarquei pro Canadá.
Lá, o mundo me virou do avesso. Cresci. Aprendi inglês, que hoje é um dos meus superpoderes. Aprendi tolerância. Aprendi que o certo não é universal. Voltei outro.
Entrei no mundo industrial e das grandes empresas. A maior siderurgica do mundo. Demorei, mas me destaquei. No entanto o ambiente era tóxico. Ostentação. Ego. Fiquei dois anos. Saí no fim de 2016.
Em junho de 2017, entrei na empresa que estou até hoje. Aqui me tornei profissional. Líder. Referência.
Mas agora, sinto que meu próximo passo é São Paulo.
Minha namorada (Futura esposa se Deus quiser), também.
Quer estudar na cidade "oceano de concreto".
Mas minha mãe… está aqui.
E eu ainda quero cuidar dela.
Então essa decisão… vai esperar.
A minha vida afetiva também tem suas camadas.
Demorei a me sentir digno de amor. As etiquetas que me davam nos tempos de escola, invadiram essa frente da minha vida. O primeiro beijo veio aos 13. Depois, muitos vazios. Uma busca por validação. Algumas pessoas marcaram minha história. Umas com paixão, outras com inspiração. Mas eu era imaturo. Repetia padrões ruins dos meus ancestrais. Me perdi. Me achei.
Até que, em 2015, surgiu minha namorada. Amiga antiga. Virou amizade colorida. Depois casal. Depois amigos de novo (10 meses em 2019). Hoje, ela é a minha escolha. Exatamente. Com ela, aprendi que amor é escolha — diária. E eu escolho ela. Todos os dias.
Hoje, com 33 anos, acho que sei quem eu sou. Ou, pelo menos, tenho uma boa noção.
Sou filho de um homem que se perdeu — e de uma mulher que resistiu. Sou irmão de alguém que me ensinou a não temer o sucesso. Sou fruto de dores que não pedi — mas que escolhi enfrentar. Sou alguém que aprendeu a amar estudando. Sou alguém que escolheu cuidar. Sou alguém que luta, todos os dias, pra não repetir o que me feriu. Sou alguém que ainda está se perdoando. Sou alguém que não tem medo de ser vulnerável.
E mais importante: Sou alguém que entende que não é definido pelo que viveu — mas pelo que constrói a partir disso.
Se você chegou até aqui, obrigado. Talvez essa seja também sua história — de outro jeito, com outras feridas, mas com o mesmo desejo: se entender. E seguir.
Nos vemos no próximo texto.








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