Incoerência e Medo: Ingredientes da Alienação Política no Mundo Corporativo
- Paulo Francisco da Silva Carneiro
- 22 de jul.
- 3 min de leitura

No ambiente corporativo, não faz muito tempo que tive coragem de me assumir progressista. Antes, o medo de retaliação me paralisava. Lembro bem do tempo de estágio, em uma siderúrgica multinacional, lá por 2015, auge da Lava Jato. À época, me vi diversas vezes balançando a cabeça em concordância com comentários absurdos — cheios de erros históricos, interpretações rasas e teorias inconsistentes. Fingir que concordava era, de certa forma, um instinto de sobrevivência.
O que eu via ali era um desligamento quase completo da realidade. Recordo de um líder reclamando que, naquele ano, não poderia trocar de carro — algo que claramente ele podia. O salário seguia depositado, religiosamente, todo dia primeiro do mês. Mas existe uma desconexão generalizada: muitos avaliam a economia pela alta ou queda da bolsa, ou pelo número da inflação no Jornal Nacional. E não é só isso. Economia é um sistema complexo, com milhões de variáveis, e não se limita a manchetes ou a simplificações.
Conviver com engenheiros — maioria ao meu redor — me mostrou o quanto isso é perigoso. Porque, ao contrário das ciências exatas, a Economia é uma ciência social, irmã da Antropologia, da Política, do Direito. Não é uma equação resolvida com duas variáveis. E ainda assim, muitos opinam com a mesma prepotência que brasileiro tem ao escalar a Seleção.
Essa arrogância é alimentada por um fator silencioso: a falta de consciência de classe. Explico: o CEO, o dono, o gerente, têm interesses particulares. Ele quer resultado, margem, bônus. Os outros 99% — nós — querem salário e segurança. Não há nada de errado nisso. São interesses distintos, oriundos de posições distintas dentro da estrutura social. O problema é quando essa diferença é ignorada — ou pior, naturalizada — nos corredores da empresa.
Mesmo em culturas organizacionais que se vendem como “inovadoras” ou “inclusivas”, o medo de discordar, de parecer o “do contra”, ainda impera. Já fui acusado de “criar motim” por ter opinião própria. Porque a opinião do patrão corre como verdade absoluta, e discordar é heresia.
Lembro das crises políticas de 2015. Vi colegas CLT, com todos os direitos garantidos pelas leis que tanto criticavam, comemorando a posse de Michel Temer — o vice que virou presidente e, pouco depois, aprovou uma reforma trabalhista que precarizou milhões de empregos. Hoje, julho de 2025, temos mais de 2 milhões de trabalhadores em aplicativos. Sem seguro, sem aposentadoria, sem nada. Jogados à própria sorte.
Essa é a incoerência. Essa é a alienação.
Existe, sim, um projeto — explícito ou não — de manter os trabalhadores longe do espelho. De não permitir que se enxerguem como classe trabalhadora, como gente do “lado de cá” da corda.
Exemplos? Tenho alguns.
O dissídio de 2025. Quando informei ao time que o reajuste seria de 7%, uma liderança disparou: “Só torcer pra esse governo ir mal todo ano, aí a inflação sobe e o aumento vem!” Não respondi — o medo, de novo. Mas a inflação oficial de 2024 foi de 4,83%. Aqueles 7% foram conquista da negociação sindical, ou seja, reajuste real. Mas falar isso é “coisa de comunista”, “contra a empresa”. Como se receber salário justo fosse um favor do patrão.
A posse de Fernando Haddad. Um outro líder debochou da nomeação dele como Ministro da Fazenda. Disse ser “inacreditável”. Tive forças para responder, ainda que de forma tímida: Haddad é bacharel em Direito, mestre em Economia, doutor em Filosofia — todos pela USP. E quem fazia piada com isso tinha formação em alguma “uni-esquina” da vida. O problema não era o currículo. Era o preconceito ideológico travestido de crítica técnica.
No fim, o que vejo é uma repetição de frases feitas. Um medo profundo de contrariar o discurso dominante. Gente que se molda à expectativa do patrão para manter o emprego — mesmo que isso signifique votar contra os próprios direitos, rir de si mesmo, apagar a própria história.
Se você chegou até aqui: parabéns. Você é forte. Meus textos são ruins, meio caóticos, cheios de sentimento. Mas esse aqui é especial: o primeiro em que falo abertamente de política e economia. Com minhas opiniões. Com minhas dores. Com minha verdade.
Obrigado por ler.
Até o próximo texto.
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